ECONOMIA E DIREITO DU PARÁ

email para publicação: paraense25@hotmail.com

terça-feira, 24 de julho de 2012

Caso Prudente de Aquino: pondo a culpa em si



 Saiu na Folha de hoje (20/7/12):
fonte: http://direito.folha.uol.com.br/blog.html

Operação foi tecnicamente correta, diz comandante da Polícia Militar
O comandante-geral interino da Polícia Militar de São Paulo, coronel Hudson Camilli, afirma que a ação que resultou na morte do empresário Ricardo de Aquino foi tecnicamente correta (…)

Para o oficial, a ação foi tecnicamente correta pois houve perseguição de suspeito que desobedeceu ordem de parar, reforços foram acionados e os policiais teriam atirado porque pensaram que seriam baleados, segundo disseram.

‘Do ponto de vista técnico, a ação deles não pode ser criticada. Do ponto de vista legal, existem reparos a serem feitos a ponto de serem presos em flagrante e submetidos a processo judicial.’

Segundo a Polícia Civil, os PMs Luis Gustavo Teixeira Garcia, 28, Adriano Costa da Silva, 26, e Robson Tadeu do Nascimento Paulino, 30, devem responder por crime militar e por homicídio doloso (quando há intenção). Um ‘reparo’ legal, segundo Camilli, é o fato de que o empresário não estava armado e isso compromete a tese de ter havido legítima defesa.

Os PMs alegam que o empresário segurava um celular, que pensaram ser uma arma. Isso, após ele ser perseguido (…) ‘A percepção subjetiva do policial é que deve ser levada em conta. Isso certamente a Justiça vai avaliar’
"

Já falamos isso aqui mas vale repetir: a polícia pode atirar para matar em dois casos: para se proteger ou proteger outra pessoa. Não se atira para matar apenas para proteger o patrimônio. Patrimônio repõem-se; a vida, não. Por isso a polícia não atira para matar quando visa apenas proteger o patrimônio. Já no caso do desrespeito à voz de parar ou de prisão dada pelo policial, ele pode usar a força, mas não deve matar. Ele só vai atirar para matar se, ao desrespeitar a voz de prisão o bandido passa a colocar a vida do policial – ou de outra pessoa – em perigo. Não importa que a pessoa tenha tentado furar um bloqueio policial (para isso existem os crimes de desobediência e resistência): a polícia não pode atirar para matar se não houver um perigo claro e imediato à vida dos policiais ou de outras pessoas. Sem essas três características – perigo claro, perigo imediato, perigo à vida – não há legítima defesa e, por isso, não há justificativa para matar.

Mas não é isso que vamos analisar hoje.

O comandante disse que não houve erro técnico, mas que houve um resultado ilegal (o que ele chama de “reparação legal”). Isso é possível? É.

O comandante poderia estar tentando apenas fazer um jogo de palavras, mas se sabia exatamente o que estava falando (e sempre se presume que a autoridade sabe do que está falando), o que ele fez foi admitir publicamente que a culpa é dele (ou do chefe dele!) e que o problema é ainda mais grave!

As operações da polícia (ou de qualquer outra instituição) devem ser organizadas tecnicamente para estarem dentro da lei. Estruturam-se as operações, estabelecem-se procedimentos, treina-se os policiais para que atinjam um objetivo que esteja dentro da legalidade. Se a operação é tecnicamente correta mas o resultado é ilegal (como ele alegou na matéria acima), é porque a estrutura, os procedimentos e o treinamento podem produzir resultados ilegais. Ou seja, não são adequados.

E quem é responsável por garantir que estruturas, procedimentos e treinamento produzam resultados que fiquem dentro da lei? O chefe. No caso da polícia, em última instância isso é responsabilidade do governador, do secretario de segurança pública e do comandante da polícia.

Pense nessa analogia: o padeiro (policial) recebe uma máquina e a instrução de quanto colocar de ingrediente e como operar a máquina. Se ele faz tudo corretamente (tecnicamente correto), mas o resultado pode ser tanto um ótimo pão (um resultado legal) quanto um tijolo de concreto (um resultado ilegal), é porque a máquina (estrutura), a receita (procedimento) ou o treinamento que recebeu são inadequados. O padeiro não constrói a máquina, estabelece a receita ou seu próprio treinamento. Quem faz isso é quem está acima dele, responsável pela padaria.

‘Ah! Mas o policial pode não ter feito tudo conforme instruído!’. Nesse caso o que eles fizeram não estava tecnicamente correto, o que o comandante acima disse que não aconteceu.


Mas existe um outro problema grave na declaração do comandante: ela foi feita. Para dizer que não houve falha técnica, é preciso investigar o que ocorreu. Isso é impossível de se fazer em poucas horas, embora o contrário seja possível: às vezes é fácil descobrir que houve uma falha porque ela é evidente. Mas descobrir que não houve falha é difícil porque você precisa testar todas as hipóteses de falha, e isso demanda muito tempo.

No caso acima, o comandante disse que não houve falha. Isso é definir uma conclusão antes de investigar, o que vai contra os princípios elementares de lógica e justiça.

Nenhum comentário:

Postar um comentário